quinta-feira, 10 de janeiro de 2013


Compulsivamente devorando sentimentos.

Se desejarmos realmente nos libertar de alguma coisa, temos de nos dar ao trabalho de pensar sobre ela até edifica-la, do contrário, isso não digerido ficará se reapresentando indefinidamente. Uma vez entendida, pode ser esquecida, passando a fazer parte da história da pessoa no arquivo do passado.

A repetição de comportamentos associa-se aos conteúdos psíquicos que não conseguimos edificar. A “compulsão à repetição” seria observada sempre que uma recordação não tem êxito. Quando o recordar algo se mostra falho, o individuo reproduziria a experiência reprimida não como uma lembrança a ser revelada ao exterior, mas por meio da repetição de alguma ação.
Nenhum individuo pode realmente se lembrar de todas as incidências e consequências de um evento de sua vida, e todas as nossas recordações sofrem, inevitavelmente, transformações. E as recordações podem, até mesmo, ter
significado de defesa contra o autoconhecimento.

Uma característica da compulsão à repetição é o fato de se repetir de diferentes modos, sem nenhuma consciência de que se está repetindo um conteúdo similar, o que constitui um dos fatores de sua recorrência continuada.

Pulsão e compulsão são elementos da mente e ocorrem em diferentes intensidades e momentos da vida. Alguns perdem o equilíbrio emocional de forma muito grave, no entanto, não é o que acontece com a maioria, em que os danos não são excessivos. Todos têm condutas restritivas, fazemos dietas, exercícios ou bebemos em festas, mas a compulsão é diferente, ela é o excesso de um determinado comportamento que está associado à descarga de tensão, de dor.

 Como a dor psíquica não pode ser experimentada, ela é canalizada para a ação motora: a compulsão. Significa um agir angustiado, repetitivo, intenso, e que resulta no ato de anestesiar a dor, transformando-a em dor corporal. O que é psíquico é vivido no corpo, como físico. Na verdade, o corpo vem em socorro da mente, entra em cena para protegê-la de uma dor psíquica insuportável.

A psicoterapia não visa à supressão, repressão do comportamento compulsivo, seu objetivo é o fortalecimento da mente para que esta esteja apta a suportar maior intensidade de sofrimento sem precisar recorrer a esse tipo de defesa compulsiva.

A organização mental se articula por meio de princípios rígidos, leis autoritárias, regras definitivas e fixas. Nessa área a mente funciona de acordo com o princípio do prazer, isto é, evitando desprazer a todo custo.

Diante de uma frustração, a dor é tão forte que o aparelho mental não consegue elaborar uma alucinação do prazer que vise à elaboração da dor. Esta condição é necessária para a percepção de emoções e de imagens as quais, armazenadas na memória, resultam em formulações disponíveis para a formação de pensamentos, o que implica na possibilidade de lidar com o real de modo a produzir respostas mais eficientes.

O que ocorre, ao contrário, é uma tentativa ultima de evitar o aniquilamento psíquico diante da dor. A pessoa desenvolve uma série de recursos internos relacionados, que lhe garante não o conforto, mas a sobrevivência. Não uma boa solução, mas a acomodação possível.

Nos casos graves, a fragilidade da mente é tal que o simples existir é motivo de sofrimento, de desprazer. É como se não houvesse um ego capaz de fazer filtragem dos estímulos da vida, um ego que deseje que selecione. E a consequência é a compulsão, para o comer, por exemplo, em que a pessoa come indiscriminadamente. Parece que existe aparelho digestório. Melhor dizendo, existe comida, que entra e sai, sem ser digerida e transformada em alimento.

O alimento, tanto real quanto psíquico, está sempre em trânsito. Nada fica. Nada é retido. Nada é selecionado. Não há o que memorizar. Não há sofrimento e dor; ficam eliminados porque não existem.
As relações de conflito do cotidiano, então, são vividas não com o outro, com o meio social, mas com o próprio corpo, com
– do recém-nascido ao adolescente. Além de ser seu organismo, na sua fisicalidade. A competição é vivida entre a pessoa e seu estômago, suas vísceras e sua necessidade de alimento. Nesta área, a pessoa sempre ganha a competição, porque é autoridade absoluta. Em relação ao seu corpo, tenta superá-lo, dominá-lo, subjugá-lo à sua vontade autoritária, isto é, à satisfação básica de realizar-se para si própria.

Vemos que a alimentação ocupa lugar central na relação entre pais e filhos um modo de ser manter vivo e aplacar a fome, comer é um meio de troca, comunicação e, às vezes, motivo de oposição e de chantagem. É em torno do ato da nutrição, que se forma a primeira relação.

Desde as primeiras mamadas, a alimentação se dá em um contexto social rico de sensações, no qual estão envolvidos não apenas gosto e olfato, mas também o tato: acolhido nos braços da mãe, o bebê coloca os lábios no mamilo. Esse contato cria uma atmosfera afetiva em que a sucção, a deglutição, a digestão e, mais tarde, a mastigação assumem significados psicológicos que vão além do ato alimentar. O leite se funde ao corpo da mãe. Não é bom apenas para sugar, mas para imaginar. Seu perfume e sabor associam-se a sensações de bem-estar, serenidade e afeto.

O aleitamento é um período especial, pois nele são engendradas as bases do sentimento de segurança interior sobre o qual, posteriormente, constrói-se a personalidade.
A mãe constantemente agitada ou angustiada transmite uma sensação de alarme: o recém-nascido percebe sua inquietude por sinais que ela expressa pela tensão muscular, pelo tom da voz, no modo como o segura e o carrega. A mulher infeliz ou deprimida não consegue transmitir serenidade: amamenta de modo mecânico, sem envolvimento. Assim como a indiferença, a pressa é um sinal que incide sobre a relação. Não é apenas a mamada, mas o que vem depois: quando está satisfeito, o lactente abandona-se nos braços da mãe, que deveria permanecer um pouco mais com ele.

Se o único tipo de relação com a mãe é a que passa pelo alimento, a criança de sete meses pode vomitar logo depois de comer, na tentativa de prolongar a relação. Se isso não for entendido como um pedido de atenção por parte da criança, um círculo vicioso poderá ter início – a mãe se angustia pensando que o bebê está doente e ele, por sua vez, continua a vomitar em busca de atenção e em resposta à agitação dela.

Para ser o centro das atenções, a criança de 2 ou 3 anos, em vez de vomitar como fazia aos 7 meses, passa a recusar alguns alimentos consumidos habitualmente pelo resto da família, transformando-se em umproblemapara os pais.

A criança sabe que o alimento é um ponto delicado, sabe do valor que o pai e a mãe dão às refeições. Assim, recusá-las é um modo de exercitar a chantagem afetiva.

A equação alimento igual a afeto está tão consolidada que, quando os filhos não comem muito, certos pais sentem-se culpados por achar que não estão cumprindo seu papel.
Sob o estímulo de um reflexo condicionado, comer em excesso pode se transformar em uma maneira rápida, imatura e inconsciente de buscar consolo, de enfrentar frustrações e decepções, de combater o tédio ou de preencher um vazio afetivo, com todas as consequências que isso acarreta para o próprio desenvolvimento físico e psicológico.

Voltamos ao inicio do texto: não havendo uma edificação da relação mãe-filho na fase da amamentação, enquanto adulto o individuo buscará inconscientemente um meio de compensar a dor psíquica através de comportamentos compulsivos. Havendo entendimento, tudo isso passa a fazer parte da história de vida desta pessoa!

Ou seja, vamos buscar o entendimento de nossas vidas, para que não busquemos comportamentos “descontrolados” e repetitivos, gerando a cada dia mais e mais sofrimentos.

Psic. Nalú.

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